De repente, olhando num espelho enorme, chamado passado,
Deparei-me com uma dolorosa, mas ao mesmo tempo,
Uma adorável sensação, toda ela, plena de certeza,
Simplesmente envelheci... Nada mais que isto, envelheci!
Agora, o que passou, passou e não posso retornar,
Mas desejo tão somente seguir, passo a passo, cada dia,
Cada minuto, cada instante que me resta, sem perder mais tempo...
O tempo é sagrado quando tempo não temos!
A vida é mais vida, quando sentimos que ela está por um fio...
A saudade do passado atormenta o presente no rosto marcado,
Pois o tempo passou e tudo mais com ele passou, não tem retorno!
O espelho mostra o que nem sempre queremos ver,
Mostra um rosto marcado num corpo que não lhe quer,
Pois a experiência que um velho traz em seus longos anos,
O corpo enrijecido não acompanha mais...
As mãos trêmulas, as pernas bambas, a visão amarelada,
A voz enfraquecida, sem falar nos cabelos brancos, os poucos,
Apenas os poucos que lhe restam, revelam, escandalosamente,
Que o tempo passou e que o mesmo tempo urge e ressurge,
Em cada madrugada apresentando-se cada vez mais curto, e,
Impiedoso, voltará um dia, que será o derradeiro...
Estou sozinho, e, mesmo rodeado de gente que me ama,
Estou sozinho, e, no meu silêncio, distribuo sorrisos para camuflar,
Para disfarçar o meu medo, porque estou sozinho, acompanhado,
Somente, tão somente dos meus pensamentos, no vai e vem,
Da vida que acompanha o ritmo da velha cadeira de balanço,
Companheira de todos os dias, que não só me suporta, mas,
Tem a força que eu já não tenho de sustentar-me no balanço,
No aconchego e na disponibilidade de embalar-me, exatamente,
Como se embala uma criança que está segura nos braços da mãe...
Mesmo que meu corpo cansado esteja a cada dia gritando que basta,
Vou seguindo adiante como se cada dia fosse o primeiro,
Que fosse este meu único dia, e, ao mesmo tempo o derradeiro!
O tempo passou, mas estou vivo e quero desfrutar cada instante,
Quero ser único, como é única a minha vida e ainda quero amar,
Pois somente o amor torna jovem o coração do velho, admirado,
Porque para muitos o dia é curto, mas para ele, um minuto,
Um mísero e ínfimo minuto tem sabor de eternidade...
O relógio na parede marca as horas como sempre marcou,
Mas estas agora são mais longas, tenebrosas e assustam o pobre velho,
Que tem tempo de sobra, mas não lhe sobra tempo para mais nada,
Porque o seu tempo, estranhamente passou...
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